Paciência é uma virtude, diz o ditado. Acho que é por isso que JRPG é tão nicho. Afinal, não é todo mundo que tem envergadura moral para aguentar 40, 50, 80, até 100 horas (ou mais!) para chegar ao fim de uma jornada, muitas vezes submetendo-se a tortuosas repetições e treinamento exaustivo. Geralmente, todo aquele esforço é recompensado com uma grande satisfação, um final épico e um suspiro resignado da sua mãe, que não aguenta mais te ver nesse estado lamentável.
Paciência é uma virtude, diz o ditado. Esperei muito pelo meu 3DS XL, cor de iogurte. Esperei muito por um JRPG que preenchesse o vazio que Bravely Default deixou. Esperei muito por Persona Q. Mas nenhuma espera foi mais longa do que a que seguiu o: “objeto saiu para entrega ao destinatário”.
Como é bom te ver, você chegou na hora H ヽ(´▽`;)/♪
Desembrulhei o pacotinho, lamentei a caixinha levemente amassada, olhei as cartinhas com cuidado e atirei tudo junto com os outros jogos para mergulhar de cabeça no fantástico mundo de Persona Q: Shadow of the Labyrinth (Atlus, 2014).
Admito que não sou a mais letrada em Shin Megami Tensei ou na sub-série Persona, algo que busco mudar desde que meu namorado comprou um PS Vita. O console veio com Persona 4 Golden, jogo pelo qual ele se apaixonou a pronto de me obrigar a jogar a versão original, no PS2. Logo entendi por que tanto "auê" em cima do game: ele é absurdamente carismático! Personagens convincentes, história intrigante, gameplay anti-frustração e uma trilha sonora que certamente vai ganhar um lugarzinho no seu coração. É fácil entender por que Persona 4 deu origem a uma comunidade de fãs sólida e devota e a spin-offs de luta e de dança (e um fan-made de corrida!). E se reclamar que é modinha vai ganhar um jogo de navezinha também.
Persona Q é, essencialmente, um dungeon crawler similar a Etrian Odyssey, também da Atlus. O game mistura os acontecimentos de Persona 3 e Persona 4, possibilitando escolher qual grupo de protagonistas o jogador quer acompanhar. Eu escolhi Persona 4 por motivos óbvios: Kanji. Kanji é vida, Kanji é amor.
“I like stupid, cute sh*t!”
Além dos personagens que conhecemos e amamos, temos a estreia de Zen e Rei. Quem são esses? Este é um dos mistérios que devemos desvendar ao longo do jogo, além de descobrir como foi que brotou uma torre do relógio no meio do pátio e o que é essa prisão em Yasogami High. Como desvendaremos os mistérios? Através de puzzles e dungeons em primeira pessoa, intrincados e exigentes.
Fanservice? Temos, e como! Persona Q salpica a história com referências a jogos anteriores da série, especialmente em relação às interações entre os personagens da série. Os desenvolvedores estavam muito cientes de que eles são todo o charme do jogo e fizeram o possível para nos envolver e mostrar o que queremos ver - mesmo que isso inclua trocadilhos horríveis com a palavra bear.
Os labirintos são desafiadores, mas divertidos de se explorar e oferecendo diferentes experiências, conforme a história progride. E, olha, difícil não se sentir realizado ao terminar um labirinto particularmente espinhoso! Como em Etrian Odyssey, a tela de baixo é usada para desenhar o mapa de onde se passa - o que se faz absolutamente necessário para marcar as passagens secretas, os baús, os power spots…
O combate não é muito diferente do que estamos acostumados; temos golpes físicos, Personas, Personas secundárias, navegação de um membro fora do labirinto. Atingir um inimigo com um golpe que corresponde a uma de suas fraquezas, contudo, ativa um boost para o personagem que o golpeou, fazendo com que o custo do uso de magic points no próximo turno seja zero (e como os ataques mágicos andam pela hora da morte em Persona Q, os boosts podem ser a diferença entre chegar ou não ao fim do labirinto). Ainda, os membros do seu grupo estão divididos em duas fileiras, o que afeta ataque, defesa e cura de acordo com sua posição. Tudo isso ao som de delícias como essa.
Persona Q é um daqueles jogos que consome sua vida. Os puzzles às vezes vão te frustrar, os labirintos vão te desgastar, moedinhas serão contadas pra comprar Medicines (já que a Margaret/Elizabeth absolutamente "enfia a faca" na taxa da enfermaria e a situação financeira pode não permitir curar todo o grupo). Existem, sim, inimigos que vão te pegar de surpresa, te moer fininho e fazer surgir aquela 'vontadinha' de plantar o 3DS na parede com um arremesso certeiro. Mas vale muito pelo resultado final. São aproximadamente 70 horas - que podem ser distribuídas em curtas sessões, pela portabilidade, ou longas, pelo desespero - que com certeza você não vai querer de volta.
Sua mãe ainda vai suspirar desapontada, porque você passa tempo demais nesse joguinho. Mas paciência.